quinta-feira, junho 14, 2007
quarta-feira, junho 06, 2007
Vontade de fugir

O surfista é um míudo disfarçado que só outro surfista será capaz de reconhecer, de compreender. Há um lado sobrehumano e inefável nos contornos que unem apaixonados, não por si, mas por uma outra força exterior. Mais que simplesmente do amor pelo mar, falo do amor pelas ondas, a aceitação da espera e a cumplicidade da vertigem. Somos todos criaturas luzidias, reféns do sol numa cidade com demasiados solários. Somos todos doentes assumidos, e a patologia permanece por descobrir. O mar fez-nos assim, e sem que soubéssemos como, voltámos a ser crianças. Voltámos a guardar dentro de nós a empatia e a simplicidade, a doença e o antídoto. O mar é a timidez que apazigua uma omnipresente vontade de fugir.
terça-feira, junho 05, 2007
terça-feira, maio 22, 2007
Desejo
Mas afinal aquilo em que depositamos esperanças durante uma vida pode não se concretizar? Acreditava que não. A pouca experiência de vida dava-lhe razões suficientes, provas provadas, que o mundo é justo no que toca à realização de desejos de verdade. Sim, desejos daqueles que o tempo não apaga. Que estão tão agarrados a nós como uma árvore à terra. Aqueles que em momento algum das nossas vidas foram postos em causa e que não são substituíveis. Desejos que mesmo depois de realizados ainda são desejos.Tinha ouvido que o universo se unia para realizar as vontades daqueles que o alimentavam com a energia de um grande desejo. Como pode uma energia tão grande ser ignorada? Uma energia que enche um homem de forças, que lhe trilha um caminho, que ocupa o seu pensamento.
Acreditava todos os dias que seria o seu dia. O dia com que sonhava, aquele que lhe estava predestinado. Acordava com a energia da ilusão e adormecia com a alegria da esperança. Será amanhã. Será amanhã. Será amanhã. Esse dia nunca chegou. Nunca lhe foi dado aquilo que lhe pertencia por direito, de insistência. Nunca a sua energia, provavelmente não suficiente, tocou a sensibilidade do universo. Nenhum astro o ajudou, nenhum deus o acudiu. Morreu murcho de desilusões. Morreu com duas palavras nos lábios, “desejo tanto” …
quarta-feira, maio 09, 2007
Leituras
Rui Cardoso Martins, "E se eu gostasse muito de morrer".
terça-feira, maio 01, 2007
segunda-feira, abril 30, 2007
Repetente
As pinturas de Vasco Monteiro caracterizam-se por serem de pequeno formato, óleo sobre tela, onde cada pintura cruza memórias pessoais com a história da pintura, resultando imagens onde o absurdo não é alheio e o ridículo das situações representadas é frequente. Vasco Monteiro revisita muito da pintura do norte da Europa, cruzando-a com as imagens colhidas das suas frequentes viagens, resultando em pequenos óleos sobre tela que servem para Vasco Monteiro brincar, ironizar, manipular ideias, imagens, vivências, mundos tão diversos oriundos da história da pintura ou de momentos registados da vida de todos os dias.Na praça
Imaginem: Dezenas de grelhas escaldantes, fumegantes, gordurosas, que libertam na mesma quantidade fumo e comida. Empregados impecavelmente brancos, chamam, pedem, discutem. As narinas respiram o cheiro dos grelhados variados. Ouvem-se as flautas dos encantadores de serpentes, os contadores de histórias e as gargalhadas dos ouvintes, as bailarinas chocalhando as cinturas, o chamamento das mesquitas. Os empregados berram, empurram, convidam. Num crescendo emocional as pessoas transformam-se. Falar não chega, gesticulam, agarram-se, agridem-se para se beijarem logo a seguir.quinta-feira, abril 26, 2007
quarta-feira, abril 25, 2007
segunda-feira, abril 02, 2007
Divagações musicais
veio um golfinho do meio do mar roxo
veio sorrindo pra mim
hoje o sol veio vermelho como um rosto
vênus, diamante, jasmim
veio enfim o e-mail de alguém
veio a maior cornucópia de mulheres
todas mucosas pra mim
o mar se abriu pelo meio dos prazeres
dunas de ouro e marfim
foi assim, é assim, mas assim é demais também
odeio você, odeio você, odeio você
odeio
veio um garoto do arraial do cabo
belo como um serafim
forte e feliz feito um deus, feito um diabo
veio dizendo que sim
só eu, velho, sou feio e ninguém
veio e não veio quem eu desejaria
se dependesse de mim
são paulo em cheio nas luzes da bahia
tudo de bom e ruim
era o fim, é o fim, mas o fim é demais também
quarta-feira, março 28, 2007
quinta-feira, março 15, 2007
terça-feira, março 13, 2007
Assim falo
“Há certos elementos fatais na vida das pessoas, elementos recorrentes, como a música. Entre a minha mãe, a Krisztina e ti, estava a música, como ligação. Provavelmente, a música disse-lhes algo que não se podia exprimir com palavras ou com acções, e provavelmente vocês disseram algo com a musica (…) Odeio essa linguagem melodiosa e incompreensível que certas pessoas utilizam para comunicar, para dizer algo de informal e irregular, sim, às vezes penso que através da música, exprimem algo de indecente e imoral.”
Sándor Márai, “As velas ardem até ao fim”.
sexta-feira, março 09, 2007

terça-feira, março 06, 2007
terça-feira, fevereiro 27, 2007
Marrocos à vista
quinta-feira, janeiro 11, 2007
Fugir ao Inverno

Procuro nas viagens uma maneira de desocupar a cabeça. De estar livre para observar. Para fazer. Sem consciência do que faço. Sem consciência do que fiz. Entrar numa vivência ainda não carregada de memórias. Nem boas nem más memórias.
Viajar é renascer. Viajo para voltar renascido.
Fotografia
quarta-feira, dezembro 06, 2006
quinta-feira, novembro 30, 2006
Marte 2

Agora longe as coisas tornam-se difusas. As certezas que tinha quando parti transformaram-se em perguntas que martelam a cada passo que dou. Se todas as decisões fossem realmente tão fáceis quanto nos parecem nos momentos quentes… O tempo passa, a vida segue lenta e eu começo a ter dúvidas sobre os caminhos que escolhi.
Mas agora é tarde, não posso olhar para trás. Ficam as boas memórias e no coração um lugar que será sempre teu. Desculpa por ter medo que sejas tu a razão para ficar. Ainda não estou pronto para ficar.
quinta-feira, novembro 23, 2006
Nas ilhas

Passado o primeiro enjoo ao ver as suas mãos, cobertas com algo mais que pele, cortarem os vegetais variados com que se faz um Nasi Goreng, concentro-me na ciência do cozinhado. Kelly está pouco à vontade com a minha curiosidade. Ri-se, nervosa, enquanto responde à minha rajada de perguntas - Que fazes? Pões isso agora? Que especiarias usas? Não cozes isso antes? Com movimentos circulares faz bailar o Nasi Goreng no Wok para logo após, com um dobrar brusco do pulso, criar uma explosão de arroz e vegetais que tentam alcançar o tecto. Quando dou o meu almoço por perdido, os ingredientes abraçam-se no ar e voltam para a panela que fervilha esperando o reencontro.
Arroz, vegetais, molho de soja e especiarias foi o meu almoço durante um mês. Não me posso queixar pois Kelly durante trinta dias, aplicou a energia e a boa vontade da primeira vez, para fazer do meu almoço de arroz e vegetais o melhor almoço de sempre.
quinta-feira, outubro 19, 2006
Esquinas

Passo por elas todos as noites. Com as pernas canejas dos saltos que se enterram entre as pedras da calçada, lançam-me um sorriso, um cumprimento ou apenas um olhar de convite. Já as conheço e associo cada cara a cada lugar específico da rua. São as minhas referências, naquelas noites em que o elevado grau de alcoolemia apaga todas as outras referências. Umas já passaram por muito outras ainda agora começaram. As histórias que circulam servem de aviso e de ensinamento.
Debaixo da minha janela oiço assobiar a Deolinda. Assobia com o à-vontade de quem anda nisto à muitos anos. De pernas grossas, braços fortes e uma cara de professora primária possui, segundo quem sabe, o maior peito de Lisboa. Conhecida pelo mau feitio, Deolinda é um exemplo. Conta-se entre as novatas que uma noite, quando um cliente recusou o pagamento, Deolinda o abraçou com tanta força entre os peitos que o desgraçado acabou sufocado. Perdeu clientes é verdade, mas agora todos pagam.
sexta-feira, setembro 15, 2006
sexta-feira, fevereiro 17, 2006
Marte 1
sexta-feira, fevereiro 03, 2006
Não aqui

Só parou de olhar quando os olhos dela fixaram os seus. Recuperou do estado de inconsciência em que aquela visão o tinha posto e voltou ao seu mundo racional.
Havia uma explicação para sentir o que sentiu. Estava numa terra que não era a sua, numa cultura que também não era a sua, excitado por aromas desconhecidos, sentia-se livre e capaz de tudo. Mas não era só. Aquela cara familiar despertou nele um vulcão de emoções, sentiu mais que uma paixão momentânea. Já tinha amado aquela mulher e ainda amava. Tinham feito promessas, projectos, tinham planeado uma vida conjunta. O tempo traí-o e levara-o para o canto do mundo onde, longe de rotinas, a essência da vida era-lhe revelada. Absorvia os sentimentos, o estar no mundo, o dia-a-dia dos outros. Tudo fazia sentido, como até aí nunca tinha feito. Naquela cara familiar viu uma segunda oportunidade. Pediu ao tempo para que desta vez não o traí-se.
sexta-feira, julho 29, 2005
Despertar

Acordou com o cantar dos pássaros, naquela altura em que o mundo se cala para os ouvir. Ao correr o fecho, a tenda foi invadida pelo ar fresco e puro da manhã. Tinha chovido durante a noite e as folhas que caíram formavam um tapete brilhante. O fogo da noite anterior era agora um amontoado de pedras pretas. À volta dele tinham jantado, bebido, conversado, partilhado. Umas vezes exaltados, outras não, falaram sobre tudo aquilo que lhes atormenta o pensamento. O vinho cumpria o seu propósito e soltava as jovens cabecinhas. Viajaram pelo universo das dúvidas terrenas e buscaram um sentido global nas experiências individuais.
Admirou os raios tímidos que reflectiam o verde mais verde que alguma vez já tinha visto. Sentiu que o homem que acordara não era o mesmo do dia anterior.
segunda-feira, julho 11, 2005
Floresta de Abetos 2
Segues sempre a direito no trilho sinuoso. Na tua vida, nunca tiveste um objectivo preciso, os objectivos que te fixaste modificaram-se com o tempo, não pararam de mudar e, afinal, nunca os tiveste. Reflectindo bem, o objectivo último da vida humana não tem importância, é como um enxame de abelhas. Deixá-lo provoca remorsos, mas apanhá-lo causa a maior desordem nos insectos, mais vale deixá-lo onde está e observá-lo sem lhe tocar. Com este pensamento, sentes-te mais leve, pouco importa onde vais, na condição que a paisagem seja bela.
Gao Xingjian, “A Montanha da Alma”.
Floresta de Abetos 1
Gao Xingjian, “A Montanha da Alma”.
quinta-feira, junho 30, 2005
Inspiração

Patagónia, tirada por Vasco Monteiro.
Caminhei durante todo o dia e no dia seguinte. Estrada a direito, poeirenta e sem trânsito. Vento contrário soprando com fúria. Ás vezes ouvia-se um camião, tinha-se a certeza que era um camião e, depois, era o vento.
Bruce Chatwin, "Na Patagónia"
segunda-feira, junho 27, 2005
Costa Rica 3/3
A mulher que nos recebeu já se retirou e o cheiro do ansiado jantar já nos invade as narinas. Pouco depois, uma travessa de arroz é posta sobre a mesa. Comemos desalmadamente sem reparar que a mulher nos faz companhia. Orgulhosamente via-nos comer como se fossemos seus filhos. Essa noite ela foi a nossa mãe.
quinta-feira, junho 23, 2005
Costa rica 2/3
quarta-feira, junho 22, 2005
Costa Rica 1/3
A vontade de chegar ao destino e o medo de se perderem, não os deixava dormir embora o cansaço fizesse com que de vez em quando uma cabeça se rendesse no vidro.












,%25201969,%2520Oil%2520on%2520canvas,%2520200%2520x%2520200%2520cm.jpg)









